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Internet explained by prisioners who have never seen it.


Três coisas que eu gostava de fazer:
1) ter um filho
2) defender os meus direitos a bater num polícia de choque que estivesse a abusar do poder e ganhar a luta
3) viver numa casa ao pé do mar com a minha namorada e comer peixe muitas vezes





O pintor Paul Gauguin amou a luz na Baía de Guanabara
O compositor Cole Porter adorou as luzes na noite dela
A Baía de Guanabara
O antropólogo Claude Levy-strauss detestou a Baía de Guanabara:
Pareceu-lhe uma boca banguela.
E eu menos a conhecera mais a amara?
Sou cego de tanto vê-la, te tanto tê-la estrela
O que é uma coisa bela?
O amor é cego
Ray Charles é cego
Stevie Wonder é cego
E o albino Hermeto não enxerga mesmo muito bem
Uma baleia, uma telenovela, um alaúde, um trem?
Uma arara?
Mas era ao mesmo tempo bela e banguela a Guanabara
Em que se passara passa passará o raro pesadelo
Que aqui começo a construir sempre buscando o belo e o amaro
Eu não sonhei que a praia de Botafogo era uma esteira rolante deareia brancae de óleo diesel
Sob meus tênis
E o Pão de Açucar menos óbvio possível
À minha frente
Um Pão de Açucar com umas arestas insuspeitadas
À áspera luz laranja contra a quase não luz quase não púrpura
Do branco das areias e das espumas
Que era tudo quanto havia então de aurora
Estão às minhas costas um velho com cabelos nas narinas
E uma menina ainda adolescente e muito linda
Não olho pra trás mas sei de tudo
Cego às avessas, como nos sonhos, vejo o que desejo
Mas eu não desejo ver o terno negro do velho
Nem os dentes quase não púrpura da menina
(pense Seurat e pense impressionista
Essa coisa de luz nos brancos dentes e onda
Mas não pense surrealista que é outra onda)
E ouço as vozes
Os dois me dizem
Num duplo som
Como que sampleados num sinclavier:
"É chegada a hora da reeducação de alguém
Do Pai do Filho do espirito Santo amém
O certo é louco tomar eletrochoque
O certo é saber que o certo é certo
O macho adulto branco sempre no comando
E o resto ao resto, o sexo é o corte, o sexo
Reconhecer o valor necessário do ato hipócrita
Riscar os índios, nada esperar dos pretos"
E eu, menos estrangeiro no lugar que no momento
Sigo mais sozinho caminhando contra o vento
E entendo o centro do que estão dizendo
Aquele cara e aquela:
É um desmascaro
Singelo grito:
"O rei está nu"
Mas eu desperto porque tudo cala frente ao fato de que o rei é mais bonito nú
E eu vou e amo o azul, o púrpura e o amarelo
E entre o meu ir e o do sol, um aro, um elo.
("Some may like a soft brazilian singer
but i've given up all attempts at perfection").

Hoje fui ao aeroporto levar o meu irmão.
Dizem que os aeroportos são não-lugares. Mentira.
Os aeroportos são lugares tremendos. Lugares onde gente tremenda faz coisas tremendas.
Lugares onde pessoas ditas e aparentemente ordinárias se fazem extraordinárias.
Pessoas que têm vidas ilusoriamente ordinárias, trabalhos desconhecidos, sentimentos banais revelam-se como pessoas que sabem que, ainda que estejam nesse não-lugar chamado aeroporto, não podem nunca fingir que são não-pessoas. Conscientes disso, na pele, no coração, no cérebro, não suspendem sentimentos. Vivem-nos. Cada uma à sua maneira. Cada uma à maneira que encontrou. Umas mais contidas, outras mais expansivas. Umas mais alegres, outras profundamente tristes. Umas calando, outras falando.
Todas partem e todas regressam. Todas acordam, comem, dormem, sorriem e choram. Todas vivem a vida que é a sua. Que não pode ser de outrem, Que não pode ser outra. Com o calor e o frio que esta lhes traz. Com encontros e reencontros, sorrisos e risos, lágrimas e choros, saudades e certezas. Faltas e confirmações. Com cada um e o outro que nele habita. Com as tensões, sofrimentos e certezas que só a vida traz. Que só vivê-lapode trazer.
Que bom é ver no outro o nosso semelhante. Ainda que seja só quando a carne treme.
por Lino Teixeira

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