Começo cá a desconfiar que sou "mediatizado"


A pergunta que lhe queria fazer é como pode acontecer uma mudança de baixo feita por uma multidão de singularidades. Como pode uma massa de diferentes criar uma espécie de sentido para criar algo de novo?
É preciso ter atenção. Não é verdade que sejam todos diferentes. É verdade que a Primavera egípcia parece nada ter que ver com o movimento de Madrid e que a luta dos subúrbios de Paris ou de Londres nada têm que ver com o movimento do Occupy Wall Street, mas é também verdade outra coisa que é a existência de um efeito de imitação extremamente poderoso. E ao falar de efeito de imitação não estou a abordar alguma coisa de simbólico: os efeitos de imitação nas bolsas mundiais são elementos fundamentais para perceber a crise em que vivemos. Por seu turno, não podemos explicar os movimentos e as revoluções de 1848 sem abordar os efeitos de imitação, mesmo numa altura em que os meios de comunicação social eram embrionários, como não podemos explicar 1968 sem eles. Devemos por isso ser prudentes nessa análise. É verdade que a força de trabalho que era composta pelo proletariado se transformou radicalmente. Nisso entraram a comunicação e o conhecimento. A comunicação não é apenas que nós dois podemos comunicar. É o facto de nós dois podermos produzir juntos através da comunicação, da informação e do saber. Actualmente assistimos a um mundo em que há formas comuns que se foram consolidando. Por exemplo, o comum da dívida. Hoje em dia se fizermos uma análise de tipo humano da exploração, vai encontrar no cimo, não o homem explorado, mas o homem endividado. E o homem endividado está dentro de uma rede, e está numa rede que pode tomar consciência do peso da dívida e revoltar-se. Há outras redes, como a dos homens “mediatizados”, aqueles que são alienados da comunicação. Mas aqui também é possível ver instrumentos de comunicação que podem determinar uma subjectividade alienada transformar-se em forças enormes de revolta. E há o homem “securizado”. Todos os governos de direita fazem um apelo evidente a isso. A procura de segurança é uma necessidade que encontra campo nas pessoas perante uma insegurança crescente. Uma ordem mantida pelo medo. E há ainda o problema do homem representado, representado de que forma? Chegamos aos absurdos mais inimagináveis: a corte suprema americana deu a autorização de serem anónimos aos que contribuem com fundos para as campanhas dos candidatos. Significa que a riqueza enquanto tal assume o papel fundamental na escolha da classe dirigente. Entramos no reino da pura loucura.

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